Lideranças de cinco territórios mobilizam suas comunidades para enfrentar desafios locais

Em processo formativo da Usina de Valores, grupos periféricos realizam atividades para sensibilizar comunidades sobre questões locais; outros 16 territórios recebem novas turmas

Cinco territórios estão promovendo mobilizações e dialogando com suas comunidades sobre problemas locais mapeados ao longo do projeto Usina de Valores, uma iniciativa de educação popular em direitos humanos do Instituto Vladimir Herzog. Em Recife (PE), Duque de Caxias (RJ), São Paulo (SP), Vitória (ES) e Belém (PA), desde junho, estão sendo realizados encontros e oficinas formativas, que oferecem vivências alinhadas ao Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), com o objetivo de “disseminar valores de solidariedade, cooperação e justiça social” para que a sociedade civil “seja capaz de identificar anseios e demandas, transformando-as em conquistas”.

Os grupos participantes já exploraram as realidades de cada local, utilizando suas próprias experiências e saberes como ponto de partida. Assim, foram estimulados a refletir sobre suas condições de vida, as influências de processos históricos e culturais, e o papel que podem desempenhar em suas comunidades. Essa experiência promoveu uma conexão entre os participantes, permitindo que se percebessem como agentes de transformação.

Atualmente, eles estão participando de oficinas para aprofundar suas discussões em torno dos desafios centrais escolhidos por eles em cada território e  planejar ações concretas que fortaleçam o compromisso coletivo em suas comunidades, em um percurso formativo que segue até o início de 2025. Enquanto isso, a equipe de direitos humanos do Instituto Vladimir Herzog articula parcerias com instituições para 16 novas turmas em territórios de São Paulo (SP), Guarulhos (SP), região metropolitana do Vale do Itajaí (SC), Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Vitória (ES) e Recife (PE).

Confira abaixo como os territórios estão se mobilizando a partir do compromisso coletivo:

Belém (PA)

Em encontro formativo em Belém (PA), participantes realizaram atividades para mapear principais desafios locais enfrentados pela comunidade em que vivem. Foto: Reprodução

Em Belém, o grupo é composto por mulheres artesãs e lideranças comunitárias. Durante as atividades formativas, realizadas em parceria com o Centro de Formação de Educadores Paulo Freire (SEMEC) e Associação Comunitária do Guamá, os/as participantes identificaram violações como o sucateamento do transporte público e a degradação ambiental, que impactam negativamente a vida da comunidade, perpetuando estigmas sociais.

A partir dos aprendizados coletivos, os/as participantes buscaram ampliar o diálogo para a comunidade local realizando dez oficinas de produções artesanais e sustentáveis, apresentando formas de empreender com sustentabilidade e consciência ambiental. Reunidos em escolas, grupos aprenderam a produzir sabão caseiro, bonecas porta, guardanapos, crochê customizado, essências do Pará, bio-jóia de açaí. Ali, tiveram a oportunidade de compartilhar seus saberes e sensibilizar a comunidade para as questões locais emergentes.

Para a divulgação das atividades, foram utilizadas estratégias como o uso de carros de som, panfletagem e convites em visitas à escolas locais.

As oficinas buscaram trazer propostas alternativas frente aos desafios enfrentados pelos moradores, enfatizando a potência coletiva e sensibilizando para as mobilizações frente ao poder público. Como ação de mobilização, o grupo está articulando uma audiência pública.

Recife (PE)

Com roteiro, direção e produção desenvolvidos pelos/as próprios/as jovens, o curta representa situações experimentadas pelos/as moradores/a do Ibura no intuito de desnaturalizar vivências do cotidiano. Foto: Diego Mariano

Em Recife, jovens entre 17 e 25 anos usam o audiovisual como ferramenta de reivindicação e estratégia para se mobilizar e sensibilizar sobre as mudanças climáticas do Ibura, bairro onde as ações da Usina de Valores são desenvolvidas em parceria com o Massapê.

Nos primeiros encontros, o grupo fez um mapeamento afetivo do território, em que refletiu como se sente afetado por cada espaço e correlacionando com valores dos direitos humanos para compreender as presenças e ausências nas suas comunidades. Outras atividades, como a experiência do Teatro do Oprimido na modalidade “Teatro-fórum”, serviram como veículo para reflexões sobre o próprio cotidiano de maneira coletiva.

No compartilhar das vivências, os jovens reconheceram o impacto das mudanças climáticas em suas vivências individuais e comunitárias. Cada membro pactuou as suas responsabilidades na produção do roteiro e gravação do curta “Águas que Arrebentam”, que destaca questões de racismo ambiental, a resistência da população e sua luta por direitos no território do Ibura. 

O lançamento da produção aconteceu nos dias 28 e 29 de novembro, no Centro Comunitário da Paz (Compaz) e no Fórum PerifaPAC, encontro com ativistas que debate os impactos da crise climática em todo território do Nordeste.

São Paulo (SP)

Para mobilização, trabalhadores dos CCAs planejam utilizar materiais visuais produzidos por crianças e adolescentes para sensibilizar comunidades em São Paulo (SP). Foto: Reprodução

Em São Paulo, o percurso formativo  é realizado com trabalhadores/as dos Centros para a Criança e Adolescente (CCAs) da Associação Santo Agostinho (ASA) — organização que atende crianças, adolescentes e idosos em situação de vulnerabilidade social. 

Para realizarem o mapeamento dos desafios enfrentados pelas comunidades atendidas, o grupo promoveu a troca de cartas intergeracionais com moradores/as locais e usou técnicas de contação de histórias, onde as crianças narraram seus desenhos, aprofundando o diálogo sobre as dificuldades enfrentadas nos territórios.

Foram identificadas questões como a falta de espaços de lazer, atendimento desumanizado em serviços públicos, naturalização da violência policial e a precariedade da infraestrutura urbana, que impactam o acesso à educação, à cultura e ao lazer.

Focado no direito à cidade e no combate ao racismo, o grupo realizou uma oficina com crianças e adolescentes do CCA Primavera. Durante a atividade, os participantes criaram cartografias representando as regiões onde vivem ou circulam — como Jardim Colombo, Paraisópolis e Porto Seguro —, destacando desafios, potencialidades e propostas para enfrentar o racismo e garantir o direito à cidade. As ações de mobilização planejadas para o próximo ano visam engajar a comunidade utilizando materiais visuais produzidos pelas crianças e adolescentes para fortalecer a luta por equidade racial e acesso pleno à cidade.

Vitória (ES)

Oficinas em Vitória (ES) promoveram trocas voltadas à escuta ativa e à desconstrução de estereótipos de gênero. Foto: Reprodução

Em Vitória, o projeto atua com trabalhadoras do Instituto Gênesis, entidade beneficente de assistência social voltada à integração no mundo do trabalho e à proteção social. 

O grupo construiu uma nova compreensão de pertencimento a partir da escuta e respeito às diferenças nas trocas sobre experiências pessoais e de atendimento, e reconheceu a desigualdade de gênero como um problema coletivo presente nas diferentes vivências.

As participantes realizaram análises críticas sobre o papel da mídia e da cultura popular na reprodução de estereótipos de gênero, incentivando a desconstrução dessas narrativas e a desnaturalização de violências cotidianas, tanto em suas vivências quanto em suas práticas de escuta profissional. Esse processo levou a uma compreensão coletiva da necessidade de romper com essas construções e promover um ambiente de dignidade e respeito.

O grupo expandiu essas reflexões para as atividades do Instituto Gênesis em várias macrorregiões, promovendo discussões sobre desigualdade de gênero no cotidiano profissional. As participantes também estão auxiliando na criação de comitês locais e buscando parcerias para fortalecer essa rede de apoio em cada região.

Duque de Caxias (RJ)

Durante oficina, o grupo refletiu sobre saúde da mulher para além do atendimento médico, relacionando-a ao reconhecimento de direitos fundamentais, saúde sexual e reprodutiva, proteção contra violência de gênero e acesso a serviços. Foto: Reprodução

Em Duque de Caxias, o percurso formativo é realizado com um grupo de mulheres líderes de sua comunidade, todas ligadas a uma igreja protestante local. Os encontros têm fortalecido a valorização de saberes intergeracionais e ancestrais, promovendo reflexões sobre o cuidado e as questões de gênero que impactam o acesso das mulheres aos seus direitos, especialmente o direito à saúde.

Para enfrentar esses obstáculos, o grupo realizou atividades voltadas a conhecer e ocupar o território, visitando equipamentos socioculturais locais e espaços de atendimento público. Essas ações fortaleceram a conexão dos participantes com a comunidade, promoveram o acesso à informações sobre serviços e reforçaram o reconhecimento da saúde como um direito fundamental, conectando essa perspectiva às questões de território e cidadania.

Esses encontros também promoveram parcerias significativas com diversos grupos sociais, como produtores rurais, pesquisadores e redes de pré-vestibular, fortalecendo a articulação em torno de problemas locais, como fome e enchentes.  As visitas contaram com representantes institucionais dos equipamentos culturais e de saúde, criando uma ponte entre as participantes e os serviços ofertados. 

As atividades mostraram que a saúde da mulher vai além do cuidado individual e do atendimento médico, envolvendo o reconhecimento de direitos, as condições de vida, a equidade de gênero e a justiça social. Para a etapa de mobilização, o grupo realizou uma vivência do circuito de herança africana, uma visita guiada a espaços socioculturais da região portuária do Rio de Janeiro com ênfase na herança negra afro-brasileira e na história das mulheres negras.

Usina de Valores chega em 16 novos territórios

A Usina de Valores expande sua ação com novas turmas em São Paulo (SP), Guarulhos (SP), região metropolitana do Vale do Itajaí (SC), Belo Horizonte (MG), Rocinha e Providência (RJ), Vitória (ES) e Recife (PE). Serão 16 turmas distribuídas em diferentes territórios periféricos das capitais e regiões metropolitanas. No total, o projeto está atuando em 21 territórios.

Atualmente, a equipe de educação em direitos humanos do Instituto Vladimir Herzog está na fase de articulação, realizando o mapeamento de organizações da sociedade civil, instituições públicas, coletivos e movimentos sociais para a construção de vínculos com atores sociais estratégicos.

A partir de janeiro, terão início as atividades de formação, que contemplam encontros formativos, oficinas e a construção de agendas coletivas para fortalecer as mobilizações e ações locais.

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